Justiça exige que Camargo Corrêa dê transporte e alimentação em Jirau
A Justiça do Trabalho de Rondônia concedeu liminar à ação movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) no fim da noite de sexta-feira, obrigando a construtora Camargo Corrêa, responsável pelas obras da Usina Hidrelétrica de Jirau, a pagar transporte, alimentação, verbas rescisórias e ajuda de custo aos operários que tiveram que deixar o canteiro de obras. Um dos maiores projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), as obras de Jirau estão paradas depois que uma rebelião que começou na terça-feira provocou a destruição de alojamentos, áreas de lazer e escritórios no local, que abrigava 22 mil trabalhadores. Caso não cumpra as exigências, a Camargo Corrêa receberá multa de R$ 5 mil por cada trabalhador afetado e por cada obrigação descumprida, além de uma multa geral de R$ 500 mil. Segundo a Camargo Corrêa, a empresa ainda não foi intimada oficialmente. A construtora alega ainda que já vinha cumprindo as determinações do MPT. (O Globo)
Operário caminhou por sete horas para fugir da rebelião
Na manhã deste domingo, cerca de 1.500 funcionários da companhia ainda esperavam do lado de fora do Ginásio do Sesi para embarcar nos ônibus que levavam os empregados para seus estados de origem. Ivanaldo da Silva Passos, de 39 anos, aguardava desde quinta-feira o ônibus para o Piauí, para ir até sua cidade, Piripiri. Dormiu pouco e esperava resignado a hora de rever a mulher e os dois filhos, de 11 e 12 anos.
- São só promessas. Dizem que sai hoje, amanhã, e nada.
Na vida de Passos, que há 20 anos percorre o país atrás de obras, o convívio com a família é escasso. Ele Já passou por São Paulo, Mato Grosso, Pará, mas é a primeira barragem da qual participa como ajudante de pedreiro. Analfabeto, não havia oportunidade em Teresina, capital de Piauí, cidade mais perto de casa. Ele chegou a Jirau há um mês, depois que um vizinho o inscreveu para embarcar num ônibus para Rondônia. A passagem foi paga pela Camargo Corrêa, mas dos R$ 180 gastos com alimentação durante os quatro dias de viagem, Passos só obteve o reembolso de R$ 60. O trabalho na usina é árduo. Ele acorda às 5h e só perto das 19h chega ao quarto que divide com sete colegas. Saía de 15 em 15 dias, para ligar para família. Os orelhões do canteiro estão quebrados. Agora ele conseguiu comprar um celular, com o salário de R$ 1.100.
O trabalho é contínuo na usina. Mensalmente, os operários alternam entre o turno diurno e noturno. A preferência é pela noite, quando fica mais fresco - eles chamam a frente de trabalho de buraco quente. As roupas são fechadas e pesadas para prevenir da malária.
O ajudante de carpinteiro José Alves da Costa, de Luizilândia, no Piauí, vendeu a moto para pagar a passagem de avião e tentar uma vaga em Jirau. Chegou em 12 de janeiro, mas só conseguiu 14 dias depois. As economias com a venda da moto foram embora. Como ajudante, ganha R$ 723. Ele só conseguiu sair com a roupa do corpo do alojamento e sofreu com o gás de pimenta lançado pelos policiais na hora do tumulto. Saiu a pé às 8h de quarta-feira de Jirau e só parou às 15h em Nova Mutum, a cidade mais próxima. Como veio trabalhar na usina por conta própria, não tem direito a receber a passagem para visitar a família. São seis filhos à espera.
A Camargo Corrêa informou neste domingo à noite que só restam 500 trabalhadores no Ginásio do Sesi, os demais já voltaram para casa. A ajuda de custo dada é de cem reais. (O Globo)
Trabalho degradante cresce em obras
Exploração migra das lavouras para a construção civil; empregados moram em quartos apertados e ficam sem água. Aquecimento do setor e atuação de aliciadores são apontados como as principais razões para o aumento dos casos.
Doente e dividindo com outros 28 operários um dormitório onde só cabem dez pessoas, Josivaldo Santos Batista, 37, foi flagrado na periferia de Campinas há uma semana em condições degradantes de trabalho -situação que, no interior de São Paulo, era comum apenas nas áreas rurais.
Na região, a exploração de trabalhadores como Batista está migrando das lavouras de cana de açúcar para a construção civil, segundo o Ministério Público do Trabalho em Campinas.
O crescimento da mecanização no campo, o aquecimento do setor imobiliário e a "profissionalização" de agenciadores que buscam mão de obra barata são apontados como fatores decisivos para essa mudança.
Contrariando determinações trabalhistas, os alojamentos desses operários não têm condições de higiene, ventilação nem conforto mínimo como camas -substituídas muitas vezes por colchões no chão.
Nos casos mais graves, o trabalhador é aliciado com promessas de trabalho ou salário bem diferentes dos encontrados na prática. Outro agravante é a restrição de mobilidade -quando patrões retêm documentos para impedir que o trabalhador consiga outro emprego.
SEM ÁGUA — Batista saiu da Bahia em outubro com a promessa de ganhar R$ 800 por mês, mas nunca recebeu mais do que R$ 600 -ele diz que, muitas vezes, parte do salário é descontada sem razão aparente.
"A gente dormia embolado e mal, depois trabalhava o dia todo, às vezes sem nem beber água", conta ele.
Rerison Charles da Silva Santos, que trabalha na construção de escola em Hortolândia (SP), disse que ele e colegas receberam comida estragada: "Eu não sou de comer carne estragada."
"Há oito anos, recebíamos uma denúncia semanal nas lavouras de cana de açúcar e praticamente nenhuma na construção civil. Hoje, é exatamente o inverso", afirma a procuradora do Ministério Público Eleonora Coca.
Desde fevereiro, o órgão flagrou trabalhadores em situação degradante em seis obras em Campinas.
Entre elas, estão uma escola estadual sob responsabilidade da construtora Itajaí, uma obra de galpões da Norpal, um condomínio residencial da MRV e outro da Goldfarb e da Odebrecht.
Para um dos diretores do Sindicato dos Trabalhadores na Construção Civil de Campinas e Região, Paulo Martins, a situação piorou com o aquecimento do setor.
"Depois que lançaram incentivos à construção, tem muita gente precisando de trabalhador, e outros se aproveitando disso", afirma. (Folha)
‘Gatos’ contratam mão de obra para usina de Jirau
Operários se queixam das promessas não cumpridas pelos homens que apresentam o canteiro da usina como um ‘Eldorado’.
As construtoras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) recorrem às mesmas práticas de recrutamento de trabalhadores dos tempos do "Brasil Grande", nos anos 70, quando o País viveu um surto de desenvolvimento econômico no período do regime militar (1964-1985).
As vagas dos canteiros de obras da usina hidrelétrica de Jirau, paralisadas depois de um quebra-quebra promovido pelos operários, foram preenchidas, nos últimos meses, por migrantes que receberam promessas de "gatos" para enfrentar mais de três dias em ônibus precários das cidades nordestinas até as margens do Rio Madeira.
A história de um dos "gatos", pagos para recrutar pessoal sem qualificação em sítios e povoados do sertão, ganhou status de lenda, tamanho o ódio que desperta nos que se aventuraram em busca do "Eldorado" de Rondônia. Os operários falam de um "Antônio Carlos", de boa conversa, que "engana direitinho o pessoal". Ninguém sabe o nome completo ou o endereço dele.
Os "Antônios" com sobrenome e demais dados de identificação são os que aparecem nas filas de reclamação. "Ele cumpriu o trato de garantir merenda na viagem, mas até agora não recebi os R$ 120 que prometeu quando a gente chegasse aqui", queixou-se o operário Antônio Raimundo Pinho da Silva, 48 anos, um dos que deixaram o alojamento da Jauru Engenharia, na madrugada de quinta-feira, após a revolta. O incêndio teria sido provocado por funcionários da Camargo Corrêa revoltados com o valor dos benefícios.
De Parnarama, a família do operário já acreditou ou teve de confiar em outros "gatos". O pai, tios e conterrâneos de Antônio Raimundo foram deslocados do Maranhão para as matas do Pará, nos anos 1970, para trabalhar nas obras da hidrelétrica de Tucuruí e da rodovia Transnordestina. Aos 18 anos, Antônio Raimundo era um dos milhares de maranhenses que atravessaram o rio Tocantins para se aventurar no garimpo de ouro de Serra Pelada. Ele não se lembra do nome do "gato" que o levou para uma frente de extração do garimpo, mas cita histórias de ordem e rigidez dentro da mina.
Longe do tempo em que ecoava a frase "a economia vai bem, mas o povo vai mal", nos anos do milagre econômico do governo Médici (1969-1974), época em que o salário real ficava bem longe dos números de aumento do Produto Interno Bruto (PIB), o País ainda enfrenta o desafio das relações de trabalho. O operário paraense Antônio César Souza da Silva, 34 anos, de Belém, reclama que o "gato", quando chegou para conversar com o pessoal num bairro da periferia da capital paraense, não disse que em Jirau havia seguranças dispostos a espancar quem entrasse alcoolizado no alojamento nem quem desrespeitasse filas no refeitório e banheiros.
"Os seguranças não sabiam conversar. Nos finais de semana, quando o pessoal passava um pouquinho da conta na bebida, eles tratavam os bêbados na pancada, como vagabundos", relata Antônio César. "Eu não sabia que a obra era uma panela difícil para sair", diz. Antônio afirma que, ainda em Belém, assinou "contrato de comprometimento" com o "gato" em que abriria mão de qualquer benefício se deixasse as obras de Jirau antes de três meses. "Se sai antes de 90 dias, a volta é por sua conta".
Com salários em média de R$ 1 mil, os operários tentam prolongar a permanência nos canteiros e esperar o cumprimento do prazo do contrato para deixarem Rondônia. "Se sair antes, não pega nem o seguro desemprego", reclama José Francisco Soares, 29, de Imperatriz.
No povoado de Jacy-Paraná, transformado do dia para a noite na maior "fofoca" do complexo do Jirau - reduto de jogos, bares e mulheres -, a maioria dos operários costuma ir nos finais de semana e os momentos de folga. Pelo acordo firmado ainda pelo "gato", eles têm direito à "embaixada", isto é, a uma visita de cinco dias à família, com transporte pago, a cada quatro meses de trabalho.
Muitos dos operários sonham em ir para os canteiros da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. É o caso do maranhense Rafael Mendes Pereira. "Aqui, em Rondônia, é um inferno. Pelo menos, em Belo Monte, a gente vai estar mais perto de casa", afirma. "Os encarregados no Jirau acham que só porque usam fardas amarelas podem agredir as pessoas."(Estado)
Escolarizado é maioria entre desocupados
Fatia de desempregados com 11 anos ou mais de estudo passa de 39,4% em 2002 para 60% em 2010, mostra levantamento. Procura por mão de obra menos qualificada e efeito estatístico da maior escolaridade explicam fenômeno.
Josué Carvalho dos Santos, pedreiro, sete anos de estudo, não fica sem trabalho há quase uma década. Janaína Alves, auxiliar de escritório, ensino médio completo, procura emprego há meses.
As diferentes trajetórias revelam o novo perfil do desemprego no Brasil. Em 2010, 60% dos desempregados tinham 11 anos ou mais de estudo, e 33,6%, até oito anos.
Esse retrato mostra mudança significativa em relação a 2002, quando os menos escolarizados (até oito anos de estudo) eram 53% dos desempregados e aqueles com, no mínimo, ensino médio completo eram 39,4%.
Os números constam em estudo feito pelo Insper, a pedido da Folha, a partir de dados de seis regiões metropolitanas. O novo perfil é confirmado por levantamento do Dieese em São Paulo, Salvador e Porto Alegre.
Em São Paulo, a fatia dos desempregados com ensino médio ou faculdade incompleta mais que dobrou entre 1999 e 2010: de 20,8% passou para 44%, segundo o Dieese.
Parte dessa mudança é consequência estatística do aumento da escolaridade.
"Houve queda grande no número absoluto de pessoas com pouca escolaridade e explosão no número dos que terminam o ensino médio", diz Naércio Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper e autor do estudo.
INCENTIVO À FORMAÇÃO — Clemente Ganz Lucio, diretor do Dieese, diz que há busca por mais escolaridade:
"Nos anos 80 e 90, o mercado caminhava para o desemprego e a precarização. Na última década, com o crescimento, aumentou a demanda por mão de obra e as pessoas se sentem incentivadas a investir em formação."
Mas a demanda dos empregadores não se restringe ao trabalhador com diploma.
A expansão da classe média tem sido acompanhada por procura maior por mão de obra menos qualificada.
"Caiu a oferta de mão de obra menos escolarizada, mas a procura subiu. Com a expansão da classe média, há mais demanda por empregadas domésticas e pedreiros", diz Menezes.
Para os especialistas, há ainda um descompasso de expectativas entre quem consegue se formar e as exigências de quem contrata.
Por um lado, há casos de trabalhadores que se acham qualificados demais para determinadas vagas.
"Não querem "sujar a carteira" aceitando qualquer trabalho", diz Ganz Lucio.
Por outro, há empresas que não encontram o perfil de funcionário que buscam.
"A formação é genérica, e o mercado, principalmente a indústria, busca profissionais mais técnicos", diz Simon Schwartzman, pesquisador do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade.
No Brasil, 8,7% dos estudantes de nível médio têm formação técnica, segundo Censo Escolar de 2009. Na China, são 42,6%, e, no Chile, 37,2%, segundo a Unesco (dados de 2008). (Folha)
Nenhum comentário:
Postar um comentário