Crise atual é tão
intensa como a de 2008, diz Mantega
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou ontem que a
atual crise mundial é tão intensa quanto a de 2008, fez um discurso mais
pessimista e alertou para os seus impactos na economia brasileira. Até então, o
Banco Central havia estimado que os efeitos negativos da crise atual no Brasil
seriam menores, e corresponderiam a um quarto daqueles sentidos na anterior.
Para combater o recuo da atividade, Mantega deixou as portas abertas para que
outros setores industriais procurem a Fazenda para pedir desoneração na folha
de pagamentos e reforçou que a política cambial será mantida.
"Essa crise afeta mais a indústria, que está indo para
baixo não somente nos países europeus, mas no Brasil e na China também.
Felizmente, somos menos afetados", disse Mantega. Na comparação com 2008,
o ministro observou que o epicentro daquela crise foi diferente e os efeitos,
mais concentrados. Agora, o impacto já se estende por mais tempo.
Mantega foi firme ao dizer que a crise europeia não é
passageira. Segundo ele, as mais recentes decisões tomadas na Europa afastaram
a crise momentaneamente, mas os grandes problemas, como a recessão e o
desemprego na União Europeia e o baixo crescimento nos Estados Unidos, não
estão resolvidos. Na sua avaliação, a crise de 2008 começou mais forte que a
atual, mas os efeitos já são semelhantes. "Hoje você tem uma gravidade tão
grande quanto em 2008, mas sem grandes instrumentos de controle na Europa, como
os Estados Unidos tiveram com o Fed [Federal Reserve, o banco central
americano]. Precisamos ter consciência de que enfrentamos uma crise bastante
grave e que não será solucionada no curto prazo, porque os europeus são lentos."
Mantega disse que a solidez fiscal do Brasil está entre as
principais armas do governo para combater o cenário adverso, que já se reflete
em déficit comercial com a Europa. Ele se mostrou preocupado em manter o
controle dos gastos públicos e chamou a sociedade e os empresários a fazer
pressão para que o Congresso que não aprove medidas que onerem o Estado, como a
vinculação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação e o reajuste
dos servidores. "Temos mais experiência em crise, mais solidez fiscal que
em 2008 e estamos com mudanças importantes em curso na economia brasileira.
Caminhamos neste ano para um dos menores déficits de toda a série histórica,
algo como 1,4% do PIB. Nossa dívida líquida, em 35% do PIB, é a menor de todos
os tempos", afirmou.
Outro braço do governo nos esforços para alavancar o
crescimento, a política cambial será mantida. Mantega foi incisivo em dizer que
os efeitos sobre a atividade não são imediatos, mas existem, e o país precisa
recorrer ao câmbio para garantir competitividade, como já vem sendo feito por
outras economias mundiais em momentos de crise. "Estamos mudando a
estrutura cambial. A redução dos juros e do custo financeiro é fundamental, mas
ainda temos longo caminho para atingir o padrão de competitividade de outros
países. Desvalorizamos o câmbio em cerca de 20% nos últimos 12 meses. Isso
significa que os nossos manufaturados estão 20% mais baratos em dólar, a nossa
mão de obra também [em dólar]", disse.
Perguntado sobre as críticas a tal política cambial, o ministro
disse que contava com o apoio de 99% dos empresários presentes no seminário.
"O outro 1% foi ao banheiro", brincou. Ele disse que quem faz
especulação cambial pode estar mais crítico. "Por que o Brasil vai fazer
papel de bobo enquanto outros países usam câmbio para dar competitividade?
Quando a economia internacional se rearranjar, o Brasil vai exportar mais em
função desse câmbio."
Mantega convocou à Fazenda os setores da indústria que
querem desonerar a folha de pagamento. Ele acredita que baratear o custo da mão
de obra para a atividade fabril será um dos motores para a recuperação da
economia - e não negou ajuda quanto a esse benefício, inclusive cogitando
reduzir ainda mais a alíquota que incide sobre o faturamento dos setores.
"Está em curso uma reforma da estrutura tributária brasileira, que é ruim,
ultrapassada e que prejudica a produção e merece redução de tributos",
disse. "A desoneração da folha é importante em momento de crise. Temos que
reduzir o custo de mão de obra. Vamos generalizar essa desoneração da
folha."
Na sua avaliação, as reduções sucessivas dos juros aliviam a
situação fiscal do governo, o que libera recursos para novas desonerações e
mais investimentos. "Isso também ajuda a inflação, porque todo mundo
embute o custo financeiro nas mercadorias. A desoneração é deflacionária."
Para Mantega, as ações do governo, o comportamento dos
bancos (reduzindo spread) e o setor empresarial compõem o tripé para a
recuperação econômica. "Há condições para investimentos, mas precisamos
recuperar a confiança de que o Brasil tem condições diferenciadas e que, com as
mudanças, estamos configurando outro país, mais competitivo, estimulando a
produção e com capacidade de competir com demais países. E temos um mercado
consumidor dinâmico como vantagem, o que não se encontra em outras
economias", disse. Para Mantega, o crescimento entre 12% e 13% ao ano para
os investimentos seria o ideal, com o crescimento do PIB em torno de 4%.
Mantega manteve a previsão de que o país vai crescer entre
3,5% e 4% no segundo semestre, mas não quis comentar o crescimento da economia
em 2012. Ele acredita que os sucessivos pacotes apresentados pelo governo terão
resultado mais visível na segunda metade do ano e citou o bom desempenho do
setor automotivo em junho, cuja média de vendas diárias de automóveis cresceu
de 12 mil em maio para 17 mil, já sob efeito da redução do Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI). (Valor)
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