Rio+20: Onde estão as
montadoras?
Tem sido cada vez mais frequente ver a indústria
automobilística engajada na causa ambiental, com planos consistentes para
tornar o automóvel cada vez mais limpo. Já faz alguns anos, inclusive, que os
slogans dos salões de veículos em todo o mundo são inspirados na batalha do
setor em busca de energias alternativas. Os fabricantes de veículos parecem à
vontade para tratar o tema quando estão em seus próprios fóruns. Mas seus
representantes praticamente desaparecem quando a discussão se amplia para um
universo de debates tão global e tão diversificado como a Conferência das
Nações Unidas.
É fácil notar a ausência das montadoras em qualquer dos
espaços dedicados a debates na Rio+20. Uma das exceções será uma apresentação,
amanhã, do vice-presidente mundial da Nissan, Toshiaki Otani, responsável pela
área de veículos elétricos e emissão zero da montadora japonesa, em um dos
fóruns dedicados ao setor privado.
Até sexta-feira, dia do encerramento da conferência,
diversos outros grupos vão, no entanto, debater os problemas da mobilidade nos
centros urbanos, o desafio de encontrar formas de reduzir o nível de emissões
de CO2 e as alternativas para o transporte. Essas discussões
não contam, no entanto, com representantes da indústria automotiva, que teriam
muito a contribuir.
Setor está ausente dos debates sobre mobilidade e
poluição
Ontem mesmo, o debate sobre cidades sustentáveis e energias
renováveis, durante o fórum de sustentabilidade corporativa, seria uma das boas
oportunidades de a indústria automobilística ter dividido seus planos com
outros agentes da iniciativa privada, interessados em compartilhar
experiências. Talvez por isso as palestras conduzidas por representantes da
indústria de eletricidade e de planejamento urbano tenham tratado o automóvel
de forma vaga.
Não se pode, no entanto, numa análise sobre a ausência da
indústria automobilística na Rio + 20, fazer injustiça com a BMW. Na contramão
da postura das demais empresas do setor, a marca alemã trouxe para a Conferência
das Nações Unidas executivos da Alemanha graduados no desenvolvimento de
energias alternativas. Eles passaram o fim de semana por conta de apresentações
sobre os planos de desenvolvimento do carro do futuro e dos resultados de
pesquisas com consumidores que experimentaram automóveis elétricos em seu
estande, de 400 metros quadrados, instalado no Parque dos Atletas.
Fora isso, a presença do setor é bastante tímida. A
Volkswagen também montou estande no Parque dos Atletas, defronte ao Riocentro,
com suas soluções para reduzir emissões e consumo. Nessa área, formada por
pavilhões com exposições da iniciativa privada e de representantes
governamentais, também podem ser vistos os ônibus híbridos da Volvo, que a
Prefeitura de Curitiba adotou para o transporte público. Mas, em geral, os
executivos dessas empresas não se envolveram com o evento.
A modesta presença dos estandes no parque e a quase total
ausência nas salas de debates da conferência revelam, em boa parte, que a
indústria automobilística participa da Rio+20 como se estivesse numa exposição.
E, apesar de a BMW se mostrar mais participativa, ainda que
tenha sido por meio de palestras limitadas à imprensa, as novidades que seus
executivos trouxeram para o Rio de Janeiro pouco servem para o consumidor brasileiro.
A experiência dos carros elétricos e híbridos que a montadora exibe no Rio
ficará, por enquanto, quase que totalmente limitada aos mercados onde os
governos calculam as taxas de impostos de acordo com o consumo e emissões do
veículo. Ou seja, nos países mais alinhados com a causa ambiental, onde recolhe
menos imposto o carro que polui menos e gasta pouco.
O Brasil ainda não adotou essa cultura. É justamente no
carro elétrico que incide a mais alta carga tributária, já que o modelo de
tributação do país é feito com base no motor a combustão e esse tipo de veículo
teria que ser importado, por enquanto. Depois da intervenção do governo para
elevar o IPI dos importados, os tributos num veículo desse tipo chegam hoje a
125%.
Como o automóvel é tradicionalmente apontado como um dos
vilões do aquecimento global, é bem provável que a indústria automobilística
tenha preferido adotar uma postura mais discreta para sequer ser notada num
fórum mais heterogêneo, como a Rio+20.
É quase certo, porém, que, logo que a conferência terminar
os fabricantes de veículos voltarão à toda carga para exibir seus planos para
ajudar a salvar o planeta. Em outubro, eles certamente retomarão o tema, e
farão muita propaganda dele, no salão do automóvel de São Paulo, a principal feira
do setor no Brasil. Protegidas, em seu território, as montadoras provavelmente
se sentem mais à vontade para falar com o público que mais lhes interessa: o
consumidor que enlouquece com as novidades que essa indústria lhes oferece. E
pelas quais ele quase sempre se endivida. (Valor, 18/06/12)
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