quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Concentrar todos os esforços para revolucionar a Educação no Brasil

TENDÊNCIAS/DEBATES FOLHA DE S. PAULO (PÁG 3)

Priorizar os avanços na educação
RICARDO PATAH


Nós, trabalhadores, estamos cansados de ter um sistema educacional que finge que ensina enquanto induz seus alunos a fingir que aprendem

Para a União Geral dos Trabalhadores (UGT), a educação mudará a nossa realidade social e econômica, com reflexos diretos na qualidade de vida dos trabalhadores e na eficiência das empresas, se contagiar todo o país e se transformar em uma mobilização política como a que nos garantiu, por exemplo, o controle da inflação.
A exemplo do Plano Real, a UGT propõe o plano nacional de educação, que deverá ser referência cultural e política para o nosso povo.
Terminadas as eleições, já podemos avançar além dos discursos de campanha e exigir do governo, em todos os níveis, que a educação seja prioridade nacional, integrando a formação desde a educação infantil, com a básica e a secundária para desembocar numa nova capacitação universitária, mais humana, mais integrada, mais brasileira e universal.
Se é para levar a educação a sério, a ponto de termos um plano nacional de educação, temos que vincular investimentos a receitas. E o Fundo Social do pré-sal pode, e deve, financiar a educação em todos os níveis, direcionando parte dos investimentos, por exemplo, para a formação técnica e profissional.
Dessa maneira, resolveríamos um dos imensos gargalos sociais, que é a ocupação dos jovens que convivem com taxas de desemprego três vezes superiores aos níveis dos adultos. Conseguiríamos, também, ampliar a ocupação destes rapazes e moças e mantê-los estudando e se preparando para entrar no mercado um pouco mais tarde, a exemplo do que já ocorre na França e na Alemanha.
Evitaríamos, assim, a exposição às influências criminosas, que encontram campo fértil nos grandes centros urbanos, com concentração de jovens cheios de energia e desocupados.
O plano nacional de educação que a UGT propõe permeará todas as políticas públicas, responsabilizará e ao mesmo tempo mobilizará todos os níveis e estruturas dos poderes da União, dos Estados e dos municípios, comprometendo, com metas e resultados, todas as instâncias de poder. Vai também gerar políticas públicas muito mais interessantes do que discursos eleitorais.
Estamos, como brasileiros e trabalhadores, cansados de ter um sistema educacional que finge que ensina enquanto induz seus alunos a fingir que aprendem. Por isso, vamos insistir para que se estabeleçam critérios de eficiência vinculados aos fluxos de investimentos.
Para a UGT, a educação deve ser investimento na cidadania que começa desde o berço, alocando investimentos na implementação da rede pública de creches, com inovações no atendimento e na gestão, envolvendo pais e mestres.
O plano nacional de educação vai nos ajudar a caminhar com orgulho em um cenário mundial em que o Brasil ocupará o lugar que merece como agregador de valores culturais, acadêmicos e de desenvolvimento social.
Nosso povo não aceitará mais o obscurantismo das ditaduras, a brutalidade da concentração de renda e a exclusão de seus cidadãos, independente de raça, região do país, opção sexual ou religiosa.
Esse é o Brasil que queremos.


RICARDO PATAH é presidente da União Geral dos Trabalhadores e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo. (Folha)

Para educadores, mudar a progressão não basta
Divisão de ciclos deve ser acompanhada de outras mudanças, defendem especialistas.

A mudança na progressão continuada no ensino do Estado de São Paulo foi elogiada por educadores ouvidos pela reportagem. Mas eles ressaltam que ela precisa ser aliada a outras alterações.
Ontem, a Folha divulgou que os ciclos do ensino fundamental devem passar para três, elevando o número de séries em que o aluno é avaliado de forma mais completa e pode ser reprovado.
Hoje, isso acontece ao final do quinto e do nono ano. Com a mudança, poderá ocorrer também no terceiro ano, ao final do ciclo de alfabetização dos alunos.
"A medida é interessante, mas inócua se não acompanhada de outras mudanças fundamentais, como uma melhor organização dos ciclos e um professor tutor, que acompanhe de perto o aluno", afirma o professor da Faculdade de Educação da USP Nilson José Machado.
Para Rose Neubauer, professora aposentada da mesma faculdade e ex-secretaria de educação de SP, a medida precisa ser acompanhada de uma recuperação sistêmica.
"Tem que recuperar o aluno passo a passo, não ao final de cada ciclo. Deixar para corrigir tudo só no final não vai adiantar."
REPETÊNCIA — Maria Helena Guimarães, ex-secretária de educação estadual SP, diz que a mudança para os três ciclos foi considerada a mais adequada. Ela participou de um grupo de estudos que avaliou no ano passado uma série de possíveis mudanças no regime de progressão continuada, a pedido do então secretário, Paulo Renato Souza.
Segundo ela, a proposta não é aumentar a reprovação, pois apenas "casos extremos" poderão ser retidos, ao contrário do que acontece ao final dos outros ciclos.
"As crianças com mais dificuldade seriam encaminhadas para salas de recuperação", afirma.
A Secretaria Estadual de Educação também afirmou que introduzirá uma prova unificada para avaliar os alunos da rede. (Folha)

''Precisamos investir em qualidade''

Um dos ministros do governo Lula mantidos no cargo, Fernando Haddad fala de seus planos para a Educação

A educação brasileira vem avançando, mas num ritmo lento. A questão, ainda, é a qualidade. O governo criou avaliação, um índice e metas que estão sendo alcançadas antes mesmo das datas previstas. Não se pode ser mais exigente com essas metas?

As metas já são exigentes. Se você comparar a renda per capita do Brasil com a dos países da Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a discrepância é muito grande. Combinando isso com a má distribuição de renda, que ainda é muito grande no Brasil, é fácil concluir que não é tarefa simples chegar à qualidade de países que têm um desenvolvimento social muito superior ao nosso. O MEC propõe manter essa linha e, eventualmente, se mais um ciclo de avaliação, em 2011, demonstrar que é possível, antecipar em dois anos a meta final. Mas temos de esperar mais um ciclo para fazer uma reavaliação com os pés no chão para depois não se frustrar. Estamos com dois anos de vantagem.

Outra questão, quando se fala em qualidade da educação, é o professor. E o novo governo deverá enfrentar o reajuste do piso salarial previsto no Plano Nacional de Educação (PNE). Salário é o que falta para o professor?

Se queremos um corpo docente preparado para os desafios educacionais temos de fazer com que a carreira seja competitiva. O que estamos sugerindo é que o professor, em média, não ganhe menos do que a média dos demais profissionais não docentes com nível superior. Porque só aí o jovem vocacionado para o magistério não vai abdicar dessa vocação por razões sócio-econômicas. A carreira docente precisa ser atraente também pelas condições de trabalho que ela oferece.

Mas o MEC investiu em formação, o piso nacional foi aprovado e o reajuste está no PNE. O que mais precisa ser feito?

Agora precisamos corrigir a carreira. Aí entra a questão da prova nacional de concurso. Duas tarefas nós cumprimos: a formação gratuita de qualidade e o piso nacional. Precisamos concluir esse processo, o que significa melhorar a condição de carreira e ao mesmo tempo ter sistema de seleção de docentes que faça sentido. Todos os estudos que conheço mostram que hoje a seleção não é bem feita.

Outra área em que o País ainda está devendo é na educação infantil. O que se pode esperar nesses próximos anos?

Em oito anos, aumentamos em 80% a matrícula na creche. Houve a inclusão no Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), a extensão de todos os programas educacionais. A creche não recebia nem merenda escolar. Mas ainda não houve uma mudança cultural. Ainda se vê a creche como um estabelecimento meramente de assistência. Precisamos, além de expandir, qualificar esse atendimento como educacional.

Na outra ponta da educação básica, o ensino médio é um eterno problema.

Eu entendo que temos de inaugurar o governo Dilma Rousseff com uma resposta para a juventude, especialmente a que atualmente não está na escola. Nessa faixa de 15 a 17 anos temos a meta de universalizar o ensino até 2016, mas temo que aí a questão não seja de oferta, mas de demanda. O aluno tem de querer estudar e, para ele desejar estar na escola, sobretudo por uma situação social que pode ser muito difícil, nós temos de tornar esse ensino médio mais interessante. E isso se consegue com a diversificação. Precisamos oferecer possibilidades que não o ensino médio tradicional. Mas, para falar a verdade, eu só notei uma maior preocupação dos Estados com ensino médio apenas de dois anos para cá. O trabalho de indução é muito difícil. (Estado)

Governo aumenta em R$ 300 estimativa de investimento por aluno em 2011

O valor mínimo previsto pelo governo para ser investido em cada aluno durante 2011 será cerca de R$ 300 a mais que o de 2010. A quantia passa de R$ 1.414,85 para R$ 1.722,05, de acordo com uma portaria ministerial da Educação e da Fazenda, publicada no Diário Oficial da União.

Os recursos provêm do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que deve ter uma receita de R$ 94,48 bilhões em 2011 - aumento de 13,7% em relação a 2010 (estimado em R$ 83,09 bilhões).

A contribuição dos estados, do Distrito Federal e dos municípios deve atingir R$ 86,68 bilhões. A complementação da União ao Fundeb corresponde a 10% desse montante, ou seja, R$ 8,66 bilhões.

Desse total, R$ 7,80 bilhões serão repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) a nove estados que não devem atingir o valor mínimo anual por aluno com sua própria arrecadação: Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco e Piauí.

Outros R$ 866 milhões estão reservados para complementar o pagamento do piso salarial de professores e financiar programas de melhoria da qualidade da educação. (O Globo)

Ministro Fernando Haddad vai apresentar a Dilma plano para que estudantes tenham formação profissionalizante em turno complementar

Mantido no cargo, o ministro da Educação, Fernando Haddad, quer que a oferta de ensino médio em tempo integral, associado ao ensino técnico, seja uma das marcas do governo Dilma Rousseff. Ele apresentará à presidente um plano de ação para que estudantes de todo o país possam fazer o curso regular num turno e, no outro, o profissionalizante. "Vamos apresentar propostas nesse sentido: reforçar o ensino médio de tempo integral", diz Haddad. O plano terá como foco também a valorização do magistério e a educação infantil. Aos 47 anos, ele está à frente do Ministério da Educação desde julho de 2005. Antes, foi secretário-executivo da pasta, de janeiro de 2004 até virar ministro.

Como será o MEC no governo Dilma?

FERNANDO HADDAD: É continuidade com inovação. Não faz sentido alterar a rota. Entendo que, para a educação brasileira, se nós levarmos em consideração o que foi anunciado em 2007 (no lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação), nossos compromissos foram honrados.

Quais serão as prioridades daqui para a frente?

HADDAD: Em primeiro lugar, a presidente Dilma assimilou com muita naturalidade um conceito que a sociedade reconheceu como forte, o bordão que não cansamos de repetir, que nossa política iria da creche até a universidade. Mas ela fez referência a três aspectos que me parecem importantes: a questão da educação infantil, a da juventude, com atenção especial ao ensino médio, e a da valorização do magistério.

O que o senhor pretende fazer na educação infantil?

HADDAD: É preciso mudar o ambiente da creche, da pré-escola, fortalecer essas unidades como estabelecimentos de ensino. Atender mais crianças, universalizar a pré-escola até 2016. Mas também atuar do ponto de vista qualitativo.

O MEC terá fôlego para fazer seis mil creches em quatro anos, como prometido?

HADDAD: Olha, conhecendo a presidente, eu diria que ela honrará seus compromissos com o país. Ela é bastante obstinada em relação à palavra.

O que o governo fará para tornar a carreira do magistério mais atraente?

HADDAD: O sistema de educação no Brasil, sobretudo o ensino fundamental, reagiu às políticas do Ministério da Educação positivamente. Assimilou a cultura da qualidade, do acompanhamento e do cumprimento de metas. Mas nós temos que reconhecer que esse ímpeto inicial vai encontrar, num médio prazo, um obstáculo, que é justamente a renovação do ambiente escolar.

Como atrair os melhores profissionais para o magistério?

HADDAD: Aí é que entra em cena um elemento que nós queremos trabalhar imediatamente, que é a ideia de uma prova nacional de concurso.

A ideia é que essa prova substitua os concursos realizados hoje por prefeituras e governos estaduais?

HADDAD: Sim. De posse do resultado, o professor poderá optar pelo sistema de ensino que oferece a ele as melhores condições de trabalho.

O que levará municípios e estados a adotarem os resultados da prova nacional?

HADDAD: Há uma grande vantagem: a seleção está pré-elaborada, basta abrir o edital e convocar (os professores), a partir dos resultados. E, obviamente, o professor que desejar exercer a profissão naquele município vai se inscrever. O magistério é uma categoria nacional, que nós temos que valorizar.

E de onde sairá o dinheiro para salários mais atrativos?

HADDAD: Na minha opinião, uma das razões pelas quais o pretexto da falta de recursos sempre aparece na mesa é o temor que existe de que isso não vai impactar a qualidade. Mas, se o gestor pode fazer uma seleção de docentes a partir do desempenho numa prova nacional de concurso, ele terá segurança de que as melhores condições oferecidas vão ter um impacto favorável na realidade da escola.

Quando será a prova?

HADDAD: A previsão é que ela aconteça no primeiro semestre de 2012.

No começo do governo...

HADDAD: Só para concluir, o terceiro ponto a que eu fiz menção é o ensino médio. Entendo que também nesse ponto nós demos passos importantes. Mas, no caminho da diversificação para atender mais e melhor às expectativas dos estudantes, sobretudo aqueles que estão fora da escola, temos que reforçar a concomitância do ensino médio com a educação profissional.

De que forma?

HADDAD: Em tempo integral. O estudante faz o ensino médio e a educação profissional em dois turnos, na mesma escola ou não. A forma concomitante avançou pouco, e eu penso que nós devemos apostar na concomitância. Porque aí você compatibiliza a necessidade do jovem que cursa o ensino médio de se profissionalizar, porque muitos deles precisam de uma profissão, em função das condições socioeconômicas da família. E você incrementa a educação de tempo integral, porque o jovem vai permanecer dois períodos na escola e não apenas um. Vamos sugerir medidas à presidente nessa direção.

Que medidas?

HADDAD: Não posso antecipar, porque vou apresentar o plano geral para a presidente para que ela avalie antes de qualquer anúncio. Vamos apresentar propostas nesse sentido: fortalecer o ensino médio de tempo integral. Tenho certeza de que nós temos condições para isso.

Com o atual orçamento?

HADDAD: Isso é o que nós vamos...

É o ponto mais difícil?

HADDAD: Por incrível que pareça, não passa só por isso. Passa muito mais por um rearranjo das forças que atuam na área da educação profissional do que propriamente por mais orçamento.

Quando o senhor terá essa conversa com a presidente?

HADDAD: O mais rapidamente possível, porque ela certamente vai começar a despachar com todos os ministros. Então, vamos apresentar um plano de trabalho para que seja validado, e a gente possa iniciar esse novo capítulo. (O Globo)