quarta-feira, 11 de abril de 2012

“Não há exemplo de um país desenvolvido que tenha o nível de spread e o baixo volume de crédito que o Brasil tem.”

Há espaço para banco privado reduzir juro, diz professor

SÃO PAULO – Os bancos brasileiros têm espaço para reduzir as taxas que cobram dos clientes. Segundo o professor de macroeconomia do Insper, Marcelo Moura, estudos anuais do Banco Central (BC) demonstram que, mesmo após retirar custos administrativos, inadimplência e compulsório, as margens das instituições ainda são expressivas, chegando a 54%.

O governo federal está em campanha para a redução dos spreads praticados pelos bancos no Brasil – diferença entre o custo de captação dos recursos e a taxa de juro cobrada dos clientes. A ofensiva começou na semana passada, com a redução das taxas cobradas pelo Banco do Brasil, e continuou nesta semana, com a Caixa Econômica Federal.

Uma reunião acontece nesta terça-feira para tratar do assunto entre o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, e o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa.

Em entrevista ao Valor, o professor Moura, PhD em Economia pela Universidade de Chicago, diz acreditar que a queda de margens é fundamental para o crescimento do Brasil. “Não há exemplo de um país desenvolvido que tenha o nível de spread e o baixo volume de crédito que o Brasil tem.”

Valor: Os bancos públicos cortaram os juros. A medida forçará os demais bancos privados a acompanhar?

Marcelo Moura: O crucial é o comportamento dos correntistas e a facilidade (na prática) que o cliente tem para trocar de banco. Tomemos como exemplo o setor de telefonia móvel, que levou alguns anos e precisou de uma boa dose de regulação para que os clientes se acostumassem a barganhar e a negociar com as operadoras na busca do melhor negócio. Levará algum tempo, mas com certeza é uma lei quase universal de que o cliente busca as melhores condições de preço e qualidade.

Valor: Qual o nível de rentabilidade dos bancos nacionais, comparado aos principais no exterior?

Moura: O ponto não seria o de comparar rentabilidade, mas o modelo de negócios. Os bancos brasileiros obtêm sua rentabilidade via alta margem (spread) em um volume reduzido de crédito. Já os bancos dos países desenvolvidos ganham com margens menores e um grande volume. Eles poderiam até ter a mesma rentabilidade, o problema não é o lucro, mas a forma como este é obtido. Para se desenvolver, o setor financeiro brasileiro precisa mudar o modelo de negócios para ter escala e uma maior produtividade. Mudar isso requer concorrência, mas também requer uma redução do compulsório, maior garantia para os bancos receberem valores em atraso e, possivelmente, uma redução de tributos.

Valor: Até que ponto os bancos privados podem acompanhar os públicos na redução do spread sem comprometer suas finanças?

Moura: Tenho absoluta confiança na competência do setor privado em se tornar mais produtivo e mais competitivo. Sendo o ambiente de negócios propício em regulação e legislação, bancos em outros países conseguem trabalhar com spreads bem menores. Por que o Brasil seria diferente? Não vejo nenhuma razão objetiva. Estudos anuais do Banco Central demonstram que, mesmo após retirar custos administrativos, inadimplência e compulsório, as margens são de 54% (dado de 2010). Sem dúvida, temos espaço para uma redução. (Valor)


'Bola' está com o governo, diz banco privado

Setor financeiro encaminha ao Ministério da Fazenda 20 propostas para viabilizar a redução de juros de suas operações. Ação do BB e da Caixa, que baixaram taxas, é citada pelo governo como exemplo de que diminuição é possível.

Na guerra entre bancos privados e o governo Dilma pela redução dos juros bancários, o setor financeiro apresentou lista de mais de 20 propostas para reduzir as taxas de suas operações e disse que, agora, a "bola" está com o Ministério da Fazenda.

O setor ouviu do governo a promessa de que a pauta será analisada, mas que os bancos privados têm, sim, espaço para reduzir os seus "spreads" (diferença entre o que pagam ao captar recursos no mercado e o que eles cobram nos financiamentos).

Nas conversas de ontem com representantes do sistema financeiro, técnicos do governo citaram que Banco do Brasil e Caixa, mesmo convivendo com as mesmas condições de mercado dos bancos privados, reduziram os juros de várias linhas.

Reservadamente, economistas dos bancos privados contra-argumentaram que BB e CEF podem correr mais riscos porque contam com a possibilidade de socorro dos cofres públicos.

No documento levado por Murilo Portugal, presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o setor argumentou que, "se é verdade que os 'spreads' brutos são elevados no Brasil, o mesmo não ocorre com as margens líquidas [o lucro dos bancos com essas operações]".

Segundo Portugal, a inadimplência representa 29% do "spread" e a margem de lucro é de "apenas" cerca de 30% do total. Disse ainda que os "spreads" vêm caindo desde 1995. "Há alguns momentos em que aumenta, como no início deste ano, mas são alguns décimos de percentagem, em razão da alta da inadimplência."

Para o presidente da Febraban, "não se trata de quem vai ceder primeiro, mas sim de todos trabalharmos na mesma direção. Agora, a bola está com a Fazenda".

CLIMA TENSO

Ontem, o setor teve um dia inteiro de reuniões com a Fazenda, algumas marcadas por um clima tenso. Entre os pedidos apresentados pelos bancos está a regulamentação do cadastro positivo de devedores, a ampliação de benefício fiscal para renegociação de dívidas e a aceitação de mais garantias.

Reivindicações antigas, como redução do compulsório (percentual que os bancos são obrigados a deixar depositado no Banco Central sem remuneração) e queda na tributação, também fizeram parte das conversas.

Na saída da primeira reunião, pela manhã, Portugal não escondeu o desconforto pelas pressões do governo pela redução dos "spreads".

Ele saiu para o ataque lembrando que a Receita deve cerca de R$ 300 milhões aos bancos, referente à prestação de serviços como recebimento de impostos federais.

A declaração foi ironizada pelo ministro Guido Mantega. Ao chegar de São Paulo, ontem à tarde, disse: "Eu pensei que eles trariam R$ 300 milhões para a gente".

Em meio à briga tornada pública, o governo ganhou um aliado. A CNDL, entidade que reúne lojistas, enviou comunicado aos 350 mil associados recomendando que façam avaliação das suas dívidas e procurem bancos com taxas menores e prazos melhores para renegociá-las, independentemente de atrasos.

O presidente da entidade, Roque Pellizzaro Júnior, citou o BB e a Caixa, lembrando que eles deram o passo inicial e diminuíram suas taxas.

terça-feira, 10 de abril de 2012

"Aumentando a base de clientes temos condições de manter o lucro"

Caixa corta juros em linhas 'menores' de sua carteira

O recado do governo já foi dado. Depois do Banco do Brasil, ontem foi a vez de a Caixa Econômica Federal cortar os juros das operações de crédito. Com reduções de até 88% nas taxas, a Caixa mostrou aos concorrentes privados que quer expandir seus tentáculos para além do crédito habitacional.

Batizado de "Caixa Melhor Crédito", o pacote tem cortes mais significativos de taxas nas linhas de cheque especial, cartão de crédito e capital de giro. São modalidades pouco expressivas hoje na carteira de crédito do banco. Do estoque de R$ 252,8 bilhões que a Caixa tinha em dezembro, 57% estavam alocados em financiamentos à habitação. O cartão de crédito somava apenas R$ 3,2 bilhões.

Com os cortes, a Caixa ampliou a projeção de crescimento da carteira de crédito do banco para este ano de 30% para 35%, alcançando R$ 340 bilhões em dezembro. O objetivo é ganhar fatias de mercado, saltando dos 12,6% para 14%. "Nossa intenção é ser o terceiro maior banco brasileiro em concessão de crédito. Hoje somos o quarto", afirma Jorge Hereda, presidente da Caixa, banco que fica atrás de Banco do Brasil, Itaú Unibanco e Bradesco no ranking de crédito.

É com mais correntistas que o banco pretende cobrir a redução dos ganhos com as operações de crédito. "Aumentando a base de clientes temos condições de manter o lucro", disse o executivo durante entrevista coletiva em São Paulo. "Temos margem e estamos dando parte dessa margem a nossos clientes", discursou Hereda.

Para compensar perdas que pode ter, o banco também deu início a um processo de revisão de sua estrutura de custos. O processamento das operações de cartão de crédito, por exemplo, deixarão de ser feitas fora do banco até o ano que vem, o que deve gerar economia.

Hereda diz não temer que a estratégia do banco piore a qualidade da carteira de crédito do banco. "A inadimplência está sob controle. Não vemos sinal de deterioração", afirmou o presidente da Caixa. Em dezembro, os pagamentos em atraso há mais de 90 dias representavam 2% da carteira do banco. Apesar de deixar clara a disputa por novos clientes, quando questionado, Hereda não informou quantos novos correntistas o banco pretende ganhar.

Depois de inicialmente negar a interferência do governo nos cortes, Hereda sinalizou que as discussões começaram fora do banco. "Já pensou se você fosse presidente e eu não dissesse que temos de caminhar de acordo com os interesses do país? O que não dá é fazer isso de forma irresponsável."

Para sustentar o novo programa, a Caixa informou que não precisará de mais capital neste ano. "Esse anúncio está dentro das perspectivas que tínhamos para o ano. Vale o que já tínhamos conversado com o Ministério da Fazenda. Não teremos de fazer novos aportes", disse Hereda. Novas capitalizações, porém, podem ser negociadas em 2013, quando as exigências de capital para os bancos no mundo todo se tornarão mais rígidas.

Apesar disso, o banco já tem no gatilho uma captação de recursos no exterior, que deve ficar entre US$ 1 bilhão e US$ 1,5 bilhão, com vencimento em dez anos.

Desde que o Banco do Brasil anunciou o corte das taxas de juros dos empréstimos na quarta-feira, as ações dos bancos estão em queda na bolsa de valores. Até ontem, a instituição que apresentou o maior recuo foi o Banco do Brasil, com 7,21% acumulados, bastante acima da perda de 2,46% do Ibovespa no período.

"O que o governo está realmente tentando fazer por meio da Caixa é barulho e levar a indústria a discutir de uma forma estruturada a redução dos spreads no Brasil, mais do que uma iniciativa para arranhar a lucratividade", afirmou o Barclays em relatório. (Valor)


Deputados cobrarão de Mantega aumento dos gastos com educação

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o secretário-executivo da pasta, Nelson Barbosa, receberão nesta terça-feira, às 17h, um grupo de mais de 20 deputados federais que compõem a Comissão Especial do Plano Nacional de Educação para discutir a possibilidade de aumentar os gastos públicos com ensino durante a vigência do plano, em 2022. A reunião será fechada, o que contraria o procedimento de audiências públicas estabelecido pela comissão.

Movimentos educacionais e especialistas do setor e a grande maioria dos parlamentares defendem que, em dez anos, o financiamento educacional do país avance dos atuais 5% para 10% do Produto Interno Bruto (PIB). O projeto de lei do governo, no entanto, fixa teto de 7% do PIB. O primeiro relatório que altera o texto do governo, feito pelo deputado Angelo Vanhoni (PT-PR), sugere chegar aos 8%.

"Vamos dizer ao ministro que os 7% do PIB que o governo colocou no projeto de lei não são suficientes para financiar as metas estabelecidas. Esperamos que o governo dê uma justificativa clara para aumentar ou não os gastos para podermos seguir com as discussões e aprovar o plano", disse o deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES), presidente da Comissão Especial do PNE.

Outros parlamentares ouvidos pelo Valor culpam o governo por atrasar a tramitação do plano, uma vez que a equipe econômica tem se mostrado irredutível na questão de aumento de gastos. "Espero que seja uma reunião produtiva. É mais do que claro que quando o governo quer fazer e tem vontade política ele consegue encontrar fontes de recursos para a educação. Veja o plano Brasil Maior e outras bondades como desoneração", complementa o deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE), que não descarta a convocação do ministro Mantega para explicar publicamente as razões da área econômica para não elevar o financiamento. "A União precisa aumentar sua participação nos gastos, que acabam ficando em mais de 80% com Estados e Municípios".

Parlamentares também são contrários à realização da reunião no Ministério da Fazenda e não em audiência pública na Câmara. "O ministro, na verdade está fugindo da audiência pública. Se sua posição não for pelos 10% do PIB vamos retomar a ideia de convocá-lo para falar na comissão", diz Ivan Valente (PSOL-SP). A Campanha Nacional pelo Direito à Educação publicou carta em que considera "preocupante" a interlocução entre Poder Legislativo e Executivo ocorrer a portas fechadas. (Valor)